domingo, 10 de outubro de 2010

MAVUTSINIM

Temos orado por sonhos e os sonhos têm vindo...

Participamos do curso do "one story", que nos apresenta um método de produção de histórias para culturas orais. O método não visa traduzir a Bíblia, mas adaptar determinadas histórias que atinjam a cosmovisão específica com a qual o missionário estaria trabalhando. Em suma, você seleciona determinadas histórias que sabe, de antemão, irão ao encontro da cosmovisão do povo. Na nossa primeira experiência, escolhi a história de Jesus acalmando a tempestade (Lc 8: 22-25), sabendo que a tempestade na cosmovisão animista seria um espírito para o povo. Após gravarmos na língua deles a história recontada pelo indígena, apresentamos essa gravação para que outro indígena bilíngue pudesse fazer uma tradução "de volta" da língua deles para o português e, assim, verificarmos como foi compreendida a história pelo indígena que a traduziu primeiramente.

Essa segunda tradução (da língua deles para o português), que, tecnicamente, é chamada de retrotradução, mostrou bem o duelo das cosmovisões que teremos de enfrentar contra o animismo. Surgiram algumas interpretações próprias de uma cosmovisão animista: Jesus deu força (!) para o vento e a chuva pararem; houve entre Jesus e o espírito do vento (Tugua) uma interação e, ainda, a adimiração dos discípulos foi deslocada de Jesus para o vento e a tempestade que "eram muito poderosos"!

"Quem será Jesus" é um cuidado que devemos ter para evitar o sincretismo religioso. Portanto, vê-se que não basta ao missionário apenas o conhecimento lingüístico, mas, principalmente, é preciso um estudo aprofundado e sensível das nuances culturais do povo para poder, de fato, intervir num ensino eficaz e eficiente.

Agora, estamos começando a produção de um jogo de mais ou menos 30 histórias selecionadas que apresentará Jesus como o "convidador" para a Festa bonita de Deus. Culturalmente, as festas têm uma importância central para eles, todavia, as festas também são de apaziguamento dos espíritos. Por exemplo, quando alguém mata uma cobra, então, é preciso fazer uma festa ao espírito da cobra para que esse espírito não avance contra algúem da família daquele que a matou. Há uma alegria em participar das festas, mas há um peso, um medo por trás também.

Assim, queremos apresentar a história da Criação como a grande festa de Deus, mas, na Queda, eles verão que fomos expulsos dessa festa bonita. Contudo, o Dono da festa prometeu um "convidador": esta figura já existe dentro da cultura deles e se refere ao indígena escolhido pelo dono de alguma festa para convidar outros povos e aldeias para a festa que esse dono vai realizar. Portanto, esse convidador é quem nos chamaria de novo para a festa bonita de Deus e é quem também nos reconciliará com Ele. Assim, todas as histórias bíblicas que trabalharemos seriam selecionadas a partir dessa perspectiva.

Creio que o principal benefício é podermos, ao fim dessas 30 histórias, apresentarmos a mensagem do Evangelho da salvação ao indígena do nosso povo e prepará-los para a futura tradução bíblica propriamente dita. Destarte, temos compreendido o "one story" como uma oportunidade de editarmos oralmente uma espécie de "Bíblia Júnior", iguais aquelas que lemos aos nossos filhos, preparando-os para a futura leitura do texto das Sagradas Escrituras.

Queridos, orem, continuem a orar, o trabalho é árduo, longo e exige o máximo possível de responsabilidade. Entretanto, Deus já tem confirmado seu plano para a comunicação do evangelho aos povos da Região. Um exemplo disso foi este momento maravilhoso que tivemos a alegria de testemunhar:

Estávamos na primeira etapa do "one story" e vários indígenas de outros povos da região encontravam-se entre nós. Estava sendo uma oportunidade de indígenas bilíngues ouvirem, pela primeira vez, o Evangelho da salvação. Todos os dias, nos reuníamos com os indígenas e contávamos histórias bíblicas nas devocionais, histórias propositalmente selecionadas para apresentarem Jesus como aquele que tem poder sobre os espíritos: a criação, a queda, Elias e os profetas de Baal, o nascimento de Jesus, as histórias de exorcismo, a morte e ressurreição, etc. Enfim, muitos indígenas bilíngues que estavam lá ouviram todas essas histórias pela primeira vez.
Então, Deus interveio!
No último dia, um dos indígenas presentes, e que ouviu todas as histórias ali narradas, compartilhou conosco algo surpreendente: ele havia sonhado naquela noite com Mavutsinim (Mavutsinim é o herói mitológico relacionado à história da criação dos índios da região).
"Eu preciso contar para vocês", começou a dizer a todos nós que estávamos ali no curso: professores, alunos e indígenas bilíngues. "Eu tive um sonho nesta noite... Um sonho com Mavutsinim... Ele apareceu para mim e disse assim: Carlos, não tenha medo das histórias que eles estão contando, eu estou gostando dessas histórias, essas histórias que eles estão contando são sobre mim. Eu quero que vocês conheçam essas histórias. Essas histórias são histórias boas"...

Esse líder indígena retornou à aldeia e ao seu povo com o testemunho para si mesmo do seu sonho e com as muitas histórias bíblicas ouvidas e guardadas em seu coração. Oremos!

Abraços sempre afetuosos de nós mesmos.

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