2. Aqui nós vemos que o homem tem que ir ao fim de si próprio
antes que possa ser salvo.
Contemplamos acima esse ladrão agonizante como um pecador
representativo, um espécime que é amostra do que todos os homens são por
natureza e prática — por natureza, em inimizade contra Deus e seu Cristo; por
prática, ladrões de Deus, utilizando mal o que ele nos deu e não conseguindo
retribuir-lhe o que é devido. Devemos
ver agora que esse ladrão crucificado foi também um caso representativo em sua
conversão.
E nesse ponto deter-nos-emos unicamente em sua situação de
desamparo. Ver a nós mesmos como
pecadores perdidos não basta. Aprender que somos corruptos e depravados por
natureza e transgressores pecaminosos pelas nossas práticas é a primeira lição
importante.
A próxima é aprender que estamos totalmente arruinados, e que
não podemos fazer nada que seja para ajudar a nós mesmos. Descobrir que nossa
condição é tão desesperadora que está inteiramente além da possibilidade de
conserto humano, é o segundo passo rumo a salvação — olhando-a pelo lado
humano. Porém, se o homem é lento para aprender que é um pecador perdido e
inapto para estar na presença de um Deus santo, ele o é ainda mais para
reconhecer que nada pode fazer para sua salvação, e que é incapaz de operar
qualquer melhoria em si próprio para se adequar para Deus. Todavia, não é senão
até que nos demos conta de que estamos “fracos” (Rm 5.6), que somos
“impotentes” (Jo 5.3), que
não é pelas obras de justiça que façamos, mas pela misericórdia divina que
somos salvos (Tt 3.5), que não é senão até que nos desesperemos de nós mesmos,
e olhemos para fora de nós mesmos para um que pode nos salvar.
O grande tipo escriturístico do pecado é a lepra, e para a
lepra o homem não pode inventar cura alguma. Somente Deus pode lidar com essa
pavorosa doença. Assim o é com o pecado. Mas, como dissemos, o homem é lento
para aprender essa lição. É como o filho pródigo, o qual, quando dissipara sua
fazenda na terra longínqua, vivendo dissolutamente, e começou “a padecer
necessidades”, em vez de imediatamente retornar ao seu pai, “foi, e chegou-se a
um dos cidadãos daquela terra”, e foi para os campos a apascentar porcos; em
outras palavras, ele foi ao trabalho .
Igualmente, o pecador que é despertado para a sua
necessidade, em vez de ir imediatamente a Cristo, tenta trabalhar por si mesmo
para obter o favor divino. Mas ele não conseguirá coisa melhor que o pródigo —
as bolotas dos porcos serão sua única porção. Ou então, como a mulher prostrada
pela enfermidade por muitos anos. Ela tentou muitos médicos antes de procurar o
grande médico: assim o pecador despertado procura alívio e paz primeiro numa
coisa e depois em outra, até completar o fatigante ciclo das ações religiosas,
e terminar “sem nenhum resultado, mas cada vez piorando mais” (Mc 5.26, Bíblia
de Jerusalém).
Não, não é senão quando já tinha “gasto tudo o que possuía”
que ela procurou Cristo; e não é senão quando o pecador chega ao fim de seus
próprios recursos que recorrerá ao Salvador. Antes que qualquer pecador possa
ser salvo, deve ele ir ao lugar da fraqueza reconhecida. Isso é o que a
conversão do ladrão agonizante nos mostra. O que ele podia fazer? Não podia
caminhar pelas sendas da justiça, pois havia um prego atravessando cada um dos
seus pés. Não podia executar nenhuma boa obra, pois havia um prego atravessando
cada uma das mãos. Não podia começar vida nova e viver melhor, pois que estava
morrendo.
E, meu leitor, aquelas suas mãos que tão prontamente agem
para justiça própria, e aqueles seus pés que tão rapidamente correm no caminho
da obediência legal, devem ser pregados na cruz. O pecador teve de ser
interrompido em suas próprias obras e feito desejoso de ser salvo por Cristo.
Uma percepção de sua própria condição pecaminosa, de sua condição perdida, de
sua condição de desamparo, não é nada mais, nada menos, do que o velho ensino
da convicção de pecado, e tal é o único pré-requisito para vir a Cristo para
salvação, pois Cristo Jesus veio ao mundo para salvar pecadores.
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