terça-feira, 19 de março de 2013

OS SETE BRADOS DO SALVADOR SOBRE A CRUZ – ARTHUR W PINK (32)


“Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”

2. Aqui vemos a absoluta santidade e a inflexível justiça de Deus.

A tragédia do Calvário deve ser vista de pelo menos quatro pontos de vista. Na cruz o homem fez uma obra: ele mostrou sua depravação ao pegar o Perfeito e com “mãos iníquas” [1] pregando-o no madeiro. Na cruz Satanás fez uma obra: ele manifestou sua insaciável inimizade contra a semente da mulher ferindo o calcanhar dele.[2] Na cruz o Senhor Jesus fez uma obra: morreu o Justo pelos injustos [3] para pudesse nos trazer a Deus. Na cruz Deus fez uma obra: ele exibiu sua santidade e satisfez sua justiça derramando sua ira sobre aquele que foi feito pecado por nós. 
 
Que pena humana é capaz ou apropriada para escrever acerca da imaculada santidade divina! Tão santo é Deus que o mortal não pode vê-lo em seu ser essencial, e viver. Tão santo é Deus que os próprios céus não são puros aos seus olhos.[4] Tão santo é Deus que até os serafins cobriam suas faces com véus diante dele.[5] Tão santo é Deus que, quando Abraão ficou de pé perante ele, clamou, “Sou pó e cinza” (Gn 18.27). Tão santo é Deus que, quando Jó entrou em sua presença, disse: “Por isso me abomino” (Jó 42.6). Tão santo é Deus que, quando Isaías teve uma visão de sua glória, exclamou: “Ai de mim, que vou perecendo porque... os meus olhos viram o rei, o Senhor dos Exércitos” (Is 6.5). Tão santo é Deus que, quando Daniel o contemplou numa manifestação teofânica, declarou: “Não ficou força em mim; desfigurou-se a feição do meu rosto” (Dn 10.8). Tão santo é Deus que nos é dito: “Tu és tão puro de olhos que não podes ver o mal, e que não podes contemplar a perversidade” (Hc 1.13).

E foi porque o Salvador estava levando nossos pecados que o trinamente santo Deus não o contemplou, virou sua face dele, abandonou-o. O Senhor fez que se encontrasse em Jesus as iniquidades de nós todos: e nossos pecados estando sobre ele como nosso substituto, a ira divina contra as nossas ofensas devesse passar sobre nossa oferta de pecado.

“Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” Essa era uma questão que nenhum daqueles ao redor da cruz podia ter respondido; era uma questão que, ao mesmo tempo, nenhum dos apóstolos podia ter respondido; sim, era uma questão que havia confundido os anjos no céu, deixando-os sem resposta. Mas o Senhor Jesus havia respondido sua própria questão, e sua resposta é achada no Salmo 22.
 
Esse salmo fornecia a mais maravilhosa predição profética de seus sofrimentos. Ele abre com as próprias palavras da quarta elocução de nosso Salvador sobre a cruz, e é seguido por mais soluços de agonia no mesmo tom até que, no versículo 3, achamo-lo dizendo — “Tu és Santo”. Ele se queixa, não da injustiça, antes reconhece a retidão de Deus — tu és santo e justo em cobrar de minhas mãos toda a dívida para a qual me fiz fiador; tenho de responder pela totalidade dos pecados de todo meu povo e, por conseguinte, ó Deus, és parte legítima em me golpear com tua espada desperta. Tu és santo; tu és puro quando julgas.

Na cruz, então, como em nenhum outro lugar, vemos a infinita malignidade do pecado e da justiça divina na punição desse. Não foi o mundo antigo coberto pelas águas? Não foram Sodoma e Gomorra destruídas por uma tempestade de fogo e enxofre? Não foram as pragas enviadas sobre o Egito e Faraó e seus exércitos afogados no Mar Vermelho? Nesses casos, o demérito do pecado e o ódio de Deus por ele puderam ser vistos; mas muito mais o é aqui, em que Cristo é desamparado por ele. Vá ao Gólgota e veja o Homem que é Companheiro de Jeová bebendo do copo da indignação do Pai, castigado pela espada da justiça divina, ferido pelo próprio Senhor, sofrendo até a morte, pois Deus “não poupou seu próprio Filho” [6] quando o pendurou no lugar do pecador. Eis como a própria natureza antecipara a terrível tragédia — o próprio contorno do chão se assemelha a um crânio. Eis a terra tremendo sob a poderosa carga da ira despejada. Eis os céus e o sol fugirem de uma tal cena, e a terra ser coberta de trevas. Aqui podemos ver a pavorosa cólera de um Deus que vinga o pecado.

Nem todos os relâmpagos do julgamento divino que foram liberados nos tempos do Antigo Testamento, nem todas as taças da ira que serão despejadas sobre uma Cristandade apóstata durante os tempos sem paralelos da Grande Tribulação,[7] nem todo choro e lamento e ranger de dentes dos condenados para sempre no Lago de Fogo jamais deram ou mesmo darão uma tal demonstração da inflexível justiça de Deus e de sua inefável santidade, de seu infinito ódio ao pecado, como o fez a ira divina que ardeu contra seu próprio Filho na cruz. Porque estava sofrendo o horripilante julgamento do pecado, foi desamparado por Deus. Aquele que era o Santo, cuja própria repulsa ao pecado era infinita, que era a pureza encarnada (1Jo 3.3), [Deus] “o fez pecado por nós” (2Co 5.21); portanto, ele se curvou mesmo perante a tempestade de ira, na qual foi mostrado o desprazer divino contra os incontáveis pecados de uma grande multidão que homem algum pode numerar. Essa, então, é a verdadeira explicação do Calvário. O santo caráter de Deus não podia fazer nada senão julgar o pecado, mesmo que fosse achado no próprio Cristo. Na cruz, pois, a justiça divina foi satisfeita e sua santidade reivindicada.

 

pastorvanderleifaria@yahoo.com.br

 



[1] Nota do tradutor: Atos 2.23, na tradução direta da King James Version inglesa do autor.
[2] Nota do tradutor: Gênesis 3.15.
[3] Nota do tradutor: 1Pedro 3.18.
[4] Nota do tradutor: Jó 15.15.
[5] Nota do tradutor: Isaías 6.2.
[6] Nota do tradutor: Romanos 8.32 (Novo Testamento Edições Paulinas).
[7] Nota do tradutor: O autor já foi partidário da controvertida teologia dispensacional, elaborada por J. N. Darby e difundida por C. I. Scofield. Depois se arrependeu, tanto que escreveu uma obra atacando virulentamente tal ensino, A Study of Dispensationalism, que pode ser acessada em http://www.pbministries.org/books/pink/Dispensationalism/dispensationalism.htm . Está nos planos do site Monergismo.com a tradução para o português desse livro, se nosso Senhor o permitir.

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