sexta-feira, 19 de março de 2010

A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR

“Até quando, SENHOR, clamarei eu, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! E não salvarás? Por que me mostras a iniquidade e me fazes ver a opressão? Pois que a destruição e a violência estão diante de mim; há contenda e o litígio se suscita. Por esta causa a lei se afrouxa, e a justiça nunca se manifesta; porque o perverso cerca o justo, e a justiça é torcida” (Hc 1.2-4).

Assim como o salmista, Asafe, Habacuque também levanta o seu clamor devido a sua perplexidade em face dos acontecimentos tenebrosos e assustadores em seu tempo. Mas e quanto a nós; o que dizer aos pais do menino João Hélio, morto de forma covarde e cruel no Rio de Janeiro, quando ouvimos dizer que seu assassino é privilegiado pela “justiça”[1] brasileira, como se aquele crime brutal não passasse de um simples deslize moral de um “pobre adolescente”? O que dizer à família de um trabalhador que é morto quando viajava num ônibus com objetivo de chegar ao trabalho onde ganhava o pão de cada dia, por um motivo tão fútil, apenas porque se recusara a fechar a janela de seu lado?

O que dizer aos familiares de Idalmo e Mildrede, mortos num acidente de carro provocado por um desastrado e infeliz motorista, o qual invadiu a pista no sentido contrário com um caminhão, jogando-os em um precipício de cerca de dez metros? O que dizer aos familiares do casal morto quanto voltava do hospital onde levaram a filha querida; especialmente quando somos informados de que o delinquente que dirigia na contra mão estava bêbado, sem carteira de habilitação e reincidente em pelo menos cinco delitos semelhantes?!!!!

O que dizer à família daquele jovem pai que é atropelado quando brincava com seu filhinho de 8 meses no parquinho, em São Paulo? E isto, considerando ainda que o tal infrator, criminoso, também já cometeu delitos semelhantes outras quatro ou cinco vezes, sem que nada lhe aconteça em termos de punição pela “justiça” brasileira. Como consolar os familiares e amigos das vítimas daquela chacina ocorrida recentemente na Nigéria? E a cada dia nos indignamos com as notícias de pessoas, quase sempre jovens, que são brutalmente assassinadas. Como dois jovens que foram recentemente assassinados em minha cidade, Volta Redonda; um deles era padre, de 32 anos, o outro um ex-seminarista católico, de 28 anos. Uma tristeza, vidas ceifadas tão precocemente!

Parece que a violência está tão comum que as pessoas já não se impressionam, não se incomodam nem ficam indignadas com a ocorrência de mortes, furtos ou qualquer outro tipo de crimes.

Habacuque estava angustiado e perplexo diante da situação conturbada na qual se encontrava. E, como Asafe, o salmista, ele também não se acomodou nem se acovardou com a situação. Mas o que fazer em tais circunstâncias? Se nos envolvermos podemos ser a próxima vítima. Nem sempre podemos socorrer ou defender os oprimidos e vítimas da violência urbana. Mas, como servos do Deus Altíssimo, podemos e devemos agir como sal da terra e luz do mundo, como Jesus nos ordenou, clamando a Deus em favor dessa geração corrupta e pervertida da qual fazemos parte. Não diz a Bíblia que “muito pode, por sua eficácia, a oração do justo”? Pois então, por que não experimentamos agir dessa forma em favor de nossa gente aflita e angustiada? Foi o que fizeram os santos do passado. Eles tiveram participação ativa no mundo em que viveram; não se enclausurando em mosteiros ou redomas “espirituais”. Eles se indignaram, se incomodaram, e, de certa forma, incomodaram a Deus pelo que presenciaram. E nós, como reagimos a tudo isso que acontece a cada dia ao nosso redor?

Primeiramente o texto supra mencionado nos mostra como o profeta reagiu e como devemos imitá-lo diante da situação caótica de um mundo em crise. O salmista “confrontou”[2] a Deus em oração. Da mesma forma, Habacuque “questionou”[3] e invocou ao Senhor, clamou a Deus por Sua graça e misericórdia. E ambos obtiveram as respostas que desejavam. Habacuque faz uma súplica ousada: “Até quando, SENHOR, clamarei eu, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! E não salvarás? Por que me mostras a iniquidade e me fazes ver a opressão?” (Hc 1.2,3a). É como se ele dissesse: “Até quando vou ficar aqui tendo que suportar tudo isto, sem poder fazer nada, falando sozinho, sem que Tu me responda e me dê alguma explicação a respeito da Tua soberania em tais circunstâncias?

As palavras do profeta nos são tremendamente familiares. Até parece o que lemos a cada dia nas manchetes dos jornais das grandes cidades de nosso país. São fatos que presenciamos todos os dias, tanto no Brasil como no resto do mundo: “Pois que a destruição e a violência estão diante de mim; há contenda e o litígio se suscita. Por esta causa a lei se afrouxa, e a justiça nunca se manifesta; porque o perverso cerca o justo, e a justiça é torcida” (Hc 1.3b,4).

Mas, graças a Deus, o profeta não estava falando ao vento – suas palavras estavam chegando ao trono da graça de Deus, suas lágrimas (como as nossas também) estavam sendo recolhidas no odre divino, como bem expressou Davi em outro salmo: “Contaste os meus passos quando sofri perseguições; recolhestes as minhas lágrimas no teu odre. Não estão elas inscritas no teu livro?... Neste Deus ponho a minha confiança e nada temerei. Que me pode fazer o homem?” (Sl 56.8,11). Que Deus nos abençoe a fim de obtermos confiança semelhante. Amém.

Pr. Vanderlei Faria
pastorvanderleifaria@yahoo.com.br
www.mananciaisdevida.blogspot.com


[1] não dá nem para usar essa palavra no sentido literal
[2] É com temor e tremor que uso tais palavras, apenas por falta de outra que melhor traduza nosso pensamento.

[3] Idem

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